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Para mim é preciso sonhar

Eu descia a Serra do Mar com um grupo de pessoas multitudo. Eram jovens, adultos, velhos, gordos, magros, crianças, executivos, gerentes, escriturários, gente de todo o tipo. Era a minha primeira descida com grupo, isso lá no ano de 83. Tudo era novidade. Depois da descida íngreme de duas horas estávamos todos no Poço das Moças. Uns e outros se davam as mãos, os braços, para atravessá-lo. Cansados, quase exaustos. Eu olhava para suas faces. E lá eu via sorrisos, íntimos, verdadeiros. Rodei a minha cabeça ao redor e vi a mata verde, pujante, a nos envolver. Voltei o meu olhar aos sorrisos. E de lá novamente à mata, mas agora mais distante, mais amplo. Lembro-me como que se fosse agora. Claramente vislumbrei milhares de pessoas multicoloridas caminhando por sobre as encostas das cordilheiras de nosso país. Como carneirinhos por sobre uma pastagem relvada. Neste momento eu tinha descoberto meu sonho.

Vinte anos se passaram. 1983 virou 2004. O sonho se realizou. O ecoturismo ganhou os quatro cantos de nosso país. Mais: ganhou destaque de proa no mundo inteiro.

Bom? Claro que sim. Mas ruim também. Ruim pois, alcançar o sonho é complicado. Fica um vácuo, um espaço por ser preenchido, por outro sonho. Sou uma pessoa movida a sonhos. Claro, realizáveis. Me estimula, me move intensamente, o ter aquele ponto lá na frente onde se quer chegar. E esses sonhos têm que ter algo muito forte de coletivo, de planetário, de distinto, de mudança paradigmática, de crença no inesgotável e inebriante potencial humano da criação e recriação.

Ando envolvido com essa busca. Sinto que esse sonho, e o caminho para sua materialização, deverão ocupar o meu resto de tempo nessa vida. Privilégio poder partir atrás de sonhos. Agradeço todo dia esta oportunidade.

Já tenho uma pista. Forte. O ecoturismo se desenvolveu, são agora centenas de pólos em nosso país disputando a crescente massa de ecoturistas. São cidades que floresceram, regiões que surgiram do nada. Várias, que experimentaram um crescimento descontrolado, sem planejamento, sem os necessários contornos para um crescimento dito sustentável. Quer dizer, onde as próximas gerações ainda encontrem aquela beleza e aquela qualidade que propiciaram seu surgimento. Locais onde a construção de pousadas se deu sem qualquer critério e onde o lixo hoje campeia por todo o lado. Onde os habitantes originais, ao invés de obterem um ganho, uma melhor qualidade de vida com esse desenvolvimento, continuaram a ser oprimidos socialmente e relegados a um papel terciário em todas as benesses.

Percebo que está na hora de se debruçar sobre esses processos, sobre estas regiões, reunir todos os atores envolvidos localmente e partir para uma tomada de consciência conjunta, com a eleição de prioridades. Resgatar o processo do desenvolvimento ecoturístico e tomá-lo em nossas mãos. Utilizando o melhor de nossa racionalidade e visão cósmica coletiva para criar os caminhos corretos para o Brasil que queremos, o planeta que necessitamos, a vida que sonhamos. Creio que estão por aqui as sementes de meu novo sonho. Como sempre, ele necessita ser partilhado, e passar a ser um sonho sonhado por muitos. Àqueles que se sentirem tocados, peço que se juntem a mim.