Publicado no(a) O Estado de S.Paulo em 04/Junho/2002
A platéia era composta por 1.200 delegados de 130 países, além de 40 ministros de Estado. O cenário, a histórica cidade canadense de Quebec. No palco, traçava-se o futuro do ecoturismo no planeta para os próximos dez anos. Da Austrália a Moçambique, da Guatemala ao Djibuti, todos querem uma fatia do bolo. Coordenador do Programa de Ecoturismo das Nações Unidas e radicado em Paris, o brasileiro Oliver Hillel afirma que a competição pelos turistas é "brava", sendo necessária uma política de desenvolvimento turístico realmente integrada e orientada para resultados. Segundo ele, esse é o modelo adotado pelo Australian Tourism Board, uma autarquia independente em que os fundos são aportados pelos setores público e privado e as decisões, compartilhadas.
E o Brasil? O início da solução é um bom plano. Valha-nos o exemplo de Joseph Chias, o consultor espanhol que criou os planos de turismo que voltaram a atrair milhares de visitantes a Barcelona, Rio, Maranhão e agora a Paranapiacaba e São Paulo.
O Brasil precisa conscientizar-se de que o ecoturismo é a bola da vez e que vai chamar a atenção por muito tempo. Quando comecei nessa área, em 1983, os repórteres perguntavam-me se isso não seria um modismo. Na ocasião eu disse que não, que foi um segmento que veio para ficar. É algo intrínseco ao ser humano. Como viver sem água, terra e ar?
Hillel, o brasileiro do Programa de Ecoturismo das Nações Unidas, diz que nosso País está perdendo o bonde do ecoturismo. De acordo com ele, a Amazônia, para os operadores de turismo internacionais, é Peru e Equador.
E olha que mesmo assim muitos estrangeiros preferem viajar para cá, como a consultora de ecoturismo de Washington, Abigail Rome, que já viajou por toda a América Latina, mas prefere o Brasil porque o povo é mais acolhedor que em qualquer outra parte do mundo.
Ecoturismo, segundo Hillel, é para países com megabiodiversidade. E isso é a cara do Brasil!
É um segmento que prevê conservação e bem-estar das comunidades envolvidas.
E preservação só tem dois modos: por decreto ou por retorno financeiro. O segundo é mais ágil e tem maior taxa de sucesso. É o caso do empresário que investe em hospedagem e exploração de atrativos, obtendo lucro. É a comunidade local, que vê no ecoturismo a melhoria de suas condições de vida, com a criação de empregos, de artesanato e de pequenos negócios trazidos pelo afluxo bem direcionado.
A Amazônia é o maior exemplo de onde a instalação de ecolodges (hotéis e pousadas ecológicas) e o extrativismo sustentável podem constituir-se num obstáculo para a devastação florestal. Entretanto, há de se estabelecer parâmetros. Para isso, vem a certificação. Mário Mantovani, da Fundação SOS Mata Atlântica, está trabalhando duro no tema, em parceria com outras instituições. O padrão a ser seguido será o internacional. Certificar é importante para orientar o consumidor e com isso exigir comprometimento do empresário.
Klaus Lengefeld, da GTZ da Alemanha, tem fundos para investir em desenvolvimento de comunidades. Basta apresentarmos um bom plano e nossa gente do interior vai ser contemplada.
O alemão Gerhard Mahl reclama que companhias aéreas como a TAM, que oferecia vôos entre o Brasil e Frankfurt, cancelaram tais freqüências. Mas os turistas germânicos querem vôos diretos para o País. Nas palavras dele, "imaginem uma velhinha tendo de descer no Charles de Gaulle para fazer conexão, sem falar um pingo de francês. Ela não vem."
Criando um plano para o Brasil, os jornalistas virão e divulgarão às pencas.
Eles verão megabiodiversidade e acolhimento, fatores de interesse do público estrangeiro. O plano vai, com certeza, prever representantes do Brasil em cada país emissor, como técnicos experientes e extensamente viajados pelo País, aptos a responder às demandas de nossos turistas em potencial. Sem ações de impacto, mas com continuidade, credibilidade e muito trabalho. Pois a concorrência, como diz Hillel, será brava.
Edgar Werblowsky é diretor de inovação, relacionamento e ações socioambientais da agência FreeWay Adventures