Publicado no(a) Site Família Aventura em Agosto/2003
A pequena Itacaré tem sido um dos meninos prodígio da Bahia nos últimos três anos. De uma pacata vila de pescadores, isolada pelos contrafortes de trechos da Serra do Mar, onde os dias se demoravam a passar, com seus barcos ao fundo e a capoeira ao lado, a vila ganhou, em pouquíssimo tempo, os ares de um importante pólo ecoturístico, talvez o de maior crescimento no país. Sua áurea de paraíso perdido bahiano atraiu um contingente cada vez maior de paulistas, mineiros, cariocas, goianos e bahianos.
O rápido crescimento da vila, provocado pelo asfaltamento do acesso a partir de Ilhéus, que com 60 km, se constitui numa "estrada-parque" com passagens subterrâneas e aéreas para os animais, e pelas inúmeras matérias na imprensa especializada, ávida por destinos novos para preencher o cada vez maior número de páginas de revistas, escritas e eletrônicas, provocou o inevitável boom.
De três simples pousadinhas que lá se contavam no início dos anos 90, hoje se encontram desde ecoresorts em praias exclusivas até uma constelação de pousadas para todos os gostos e bolsos. A questão estaria muito bem não fosse a falta de uma lei do uso do solo que disciplinasse as construções, um sistema de coleta e deposição do lixo, uma sistema coletor de esgotos. Enfim, a infraestrutura básica para suportar esse avassalador crescimento.
O que lá ocorre é muito comum em outros destinos no país, em que não há um entrosamento entre os atores envolvidos, sejam governos estaduais, municipais, empresariado, comunidade. Nos Lençóis Maranhenses os investimentos e a política do Plano Maior, que deu um enfeixe profissional às políticas estaduais para o turismo, nâo encontrou ressonância no plano municipal. A falta de sintonia faz com que muitas vezes os 20% do projeto que cabem ao poder municipal acabam por comprometer o todo. Divergências políticas, falta de uma visão de longo prazo, lamentavelmente conseguem por muito a perder.
Os pousadeiros de Itacaré, conscientes do risco que correm, têm procurado o apoio do poder municipal. A administração muito centralizadora ainda não enxergou o que a sociedade tem a ganhar, no médio e longo prazo, com uma união de todos, iniciando-se com uma parceria visionária estado-empresa.
Operadores de ecoturismo, como a FreeWay, que descobriram Itacaré em seus tempos de vila e canções, se sentem responsáveis e comprometidos com o futuro do destino. Querem que a sustentabilidade realmente ocorra por aquelas ondas. Promoveram, em parceria com um receptivo local, a coleta do lixo nas praias, tendo remetido para lá sacos de coleta desde São Paulo. É pouco.
O pobre distrito de Taboquinhas foi o local escolhido por Otto Hassler, um alemão especialista em rafting e aficcionado por comunidades, a criar um rafting e um cascading. Criou empregos na comunidade, ensinou o beabá, num local onde médico é figura de linguagem.
Há na região competentes projetos de ONGs que visam integrar o trabalhador local, muitas vezes oriundo de um fracassado cultivo de cacau, varrido pela praga da vassoura-de-bruxa nos anos 80 e 90, ao processo ecoturístico. A ONG Projeto Jupará, criada em meados dos 80 com sem-terra, despejados das fazendas pela praga, conseguiu revirar o jogo e dar um patamar de sustentabilidade, trabalho e esperança para essa gente. Apoiados pela WWF já há anos, receberam recentemente a visita de um empresário suiço, Linard Mueller, que sensibilizado pela causa, se fez de ponte entre os produtores (agora orgânicos e futuramente biodinâmicos) e a indústria cacaueira na Suiça. Pronto. Em pouco tempo o Jupará recebia um contrato de uma importante empresa chocolateira suiça.
As possibilidades são muitas, o pólo ainda tem um importante papel a cumprir. Resta organizar o circo, recuperar o que já foi perdido, reeditar o novo. Cabe a realização de um seminário local, com a presença de todos os atores, públicos e privados, estaduais, municipais, pousadeiros, receptivos, guias, restaurantes, operadores ecoturísticos emissivos, ONGs, com o objetivo de se desenhar a Itacaré que se quer para os próximos 5, 10 e 20 anos.
O planejamento passa pela definição do público turista que se quer atingir, e os canais adequados para esse fim. Vale envolver os municípios vizinhos de Ilhéus, Serra Grande, Una, para a definição de uma macropolítica regional.
O Brasil não quer, a Bahia não pode se permitir, que Itacaré perca, em mais alguns poucos anos, o apelo que fez dela uma pérola dourada nesses cantos da Bahia. A responsabilidade é de todos nós envolvidos nesta parceria. Vamos fazer de Itacaré um modelo ímpar de gestão de ecoturismo litorâneo. Com a palavra, o sr prefeito municipal.